Um beijo roubado

*Se você não gosta de saber do que acontece em um filme antes de assistí-lo, resista. Não leia! Mas o texto, na humilde opinião de dono do texto, ficou legal.

Fui assistir a “Um beijo roubado” sem esperar muito dele. A princípio, quando li a sinopse e vi quem eram os atores, me animei. Depois, ao saber que era do Wong Kar-Wai, fiquei temeroso. O único filme dele que havia assistido até então era “2046”. Eu até gosto de filmes mais artísticos, ou não lineares, diferentes do que Hollywood está acostumada a fazer, com os clichês e previsibilidade de sempre. Mas “2046” é um filme artístico demais para mim. Há coisas que são artísticas, mas podem ser compreendidas, abarcadas por nosso conhecimento, mesmo que não entendamos muito bem. O Tom Zé é um caso assim. A gente não entende muito bem a cabeça dele, ou muitas vezes, até mesmo a obra. Mas ele é gênio, não tem como negar. É o caso que a gente olha, não assimila, mas entende e percebe que existe uma genialidade ali. Com o Wong Kar-Wai, não consigo. Ainda não sei se é pela minha incapacidade de perceber ou se é falta de genialidade da parte dele e as pessoas que o idolatram, fazem isso apenas por posarem de intelectuais. Isso é mais freqüente do que a gente imagina. Se as pessoas, de fato, assumissem o que pensam ou o que não sabem, nos sentiríamos menos “incapazes” ou por fora de alguma coisa.

Eu não gostei de “2046”, justamente porque não entendi porcaria nenhuma do filme. Entendi que o cara utiliza milhares de digressões e meta-lingüagem, mas que não me ajudaram em nada a pensar em coisas da minha vida, ou me proporcionar um bom passatempo. Já “Um beijo roubado” consegue isso. A gente se vê no comodismo da Beth, ou Lizzie. A gente se vê na impulsividade da mesma Lizzie, ao decidir sair e viajar sem destino. A gente se vê na passividade e na espera de Jeremy, mas também de saber que no fim, vai dar tudo certo.

Um beijo roubado, tem uma ótima trilha também. Para quem quer ver Norah Jones cantando, isso não acontece. Tem uma música dela que abre o filme e a que fecha o filme. Mas ela não canta. Aliás, acho isso legal. O ato cantar no filme, não acontece pra valer. Quando alguém canta em algum filme, a pessoa apenas interpreta que está cantando. Ou você acha que em Moulin Rouge ou Chicago, o som captado no momento daquela cena é exatamente o que você ouve? Aham. Do mesmo jeito que o que você lê aqui não é exatamente como foi saindo da minha cabeça e eu vou editando, mudando, para ficar mais legal e agradável [se é que isso é possível], o que a gente ouve em uma cena que alguém canta, é, na verdade, uma gravação em estúdio e a pessoa interpretando a canção. Óóóóó [expressão de surpresa]. Ou seja, a Norah Jones não cantar no filme não é uma coisa ruim, é uma boa coisa! Ah, tem a Cat Power também no longa, mas ela também não canta. Aliás, é só uma ponta e como pouca gente sabe quem é a Chan Marshall [Cat Power], a beleza dela sobressai. Mas tem uma música dela [The Greateste, do CD The Greatest] que toca várias vezes durante o filme e quem é meio fissurado em trilhas, acaba indo atrás e descobre que é uma música da Cat Power. E para as meninas, tem o Jude Law, que tem se mostrado mais do que um ator bonitinho.

Sou um cara meio exagerado. Se me dizem que algo é ruim, eu já vou esperando a maior porcaria da história. Se me dizem que é bom, vou esperando algo sublime, que me arrebatára. Por isso, a melhor lição que tirei disso tudo é: quanto menor a expectativa, melhor o filme fica. Isso eu já tinha “descoberto”, no mínimo, entendido. Tinham me dito que o filme era mais ou menos, que no começo cansava e só do meio pro final, ficava um pouquinho interessante. Ou seja, eu acabo gostando muito mais do filme [do que deveria?] e quando vou dizer pra alguém, boto uma pilha, e com isso, é muito provável que a pessoa ache o filme bem mediano. Eu fico em dúvida. Se falo mal do filme, pode ser que ela nunca assista. Se falo bem e ela assistir, a expectativa dela será alta e o filme será inferior ao esperado. O bom disso é que, quando essa pessoa for falar do filme pra alguém, ela vai falar que o filme é fraco e se a outra pessoa assistí-lo, gostará como eu. É uma coisa doida, de um dizer que é bom, e a gente não gostar. Aí a gente diz que não gostou e quem for assistir, com a nossa opinião na cabeça, vai adorar. Nesse ciclo maluco que ajuda uns a gostarem mais do filme e prejudica outros, espero que sempre me digam que o filme é ruim. Não tenham medo. Eu sou teimoso e assisto mesmo assim.