Já é clichê falar sobre desacelerar, diminuir o ritmo, ir com mais calma e tudo o mais que você sabe, se não, não seria clichê. Mas os clichês existem porque são verdadeiros, então é verdade. Tenho buscado desacelerar quando posso, ir com mais calma quando a sensação é de descer uma ladeira correndo e parecer que suas pernas não vão parar sozinhas, fazendo-o estatelar de cara ao final da descida.

A gente não se machuca mais, né? Estamos sempre com tanto medo da ferida que não nos arriscamos. Lembro de joelhos ralados, onde nem dava tempo de tirar a casquinha, já que o asfalto fazia isso por mim. Pensei nisso pois não foram poucas as vezes que caí de skate ou bicicleta e as palmas das minhas mãos ficaram no mínimo raladas para salvar alguns dentes e o nariz. É sadismo sentir saudade de ter as mãos avermelhadas e latejando (você ainda lembra da sensação?) pelo impacto no paralelepípedo? Ou é nostalgia de ter tempo para se machucar, ficar sarado e se machucar de novo?

Existe aquela velha piada de dois caras adultos que vão brigar e um diz para o outro “Só não bate no rosto, que amanhã eu trabalho”. Não podemos ficar doentes, nos machucar ou sofrer. O trabalho não deixa. Mesmo que você não vá para um escritório, trabalhe de casa ou seja freela, você tem coisas a fazer e não pode se dar ao luxo de ficar machucado. Acabamos diminuindo nossas feridas e, quando vemos, estamos deixando de lado as feridas dos próximos também.

Descendo a ladeira, a sensação de que as pernas não vão mais parar é uma delícia, ainda mais com o vento no rosto e a loucura de fechar os olhos. A queda ao final dela talvez seja iminente, mas mesmo assim nos entregamos. O problema é que não podemos mais nos dar ao luxo de subitamente pararmos ou arriscarmos uma queda. Simplesmente continuamos correndo porque, agora, não temos tempo para cair. E, pela primeira vez, essa brincadeira dá medo.